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terça-feira, 9 de agosto de 2011

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Um dia de descanso e estamos de volta à sala de ensaio e agora ainda mais cedo: 08:00 horas da manhã.

Voltamos recheados dos comentários sobre o nosso processo. Sim, o que aconteceu no Tempo Festival causou e causará muitos estragos, no melhor dos sentidos. Não posso deixar de dizer que a sensação de compartilhar aquilo que com tanto cuidado fizemos nascer é das melhores possíveis.
Ainda hoje uma amiga me parou no corredor da Unirio com vontade de falar. Ela queria compartilhar comigo e com Diogo o que tinha achado do nosso processo, e ela veio se aproximando com brilho nos olhos, o brilho de quem quer trocar, de quem quer dizer pra se aproximar, pra construir junto aquilo que só tem sentido se junto estivermos. Nunca antes experimentei a sensação da troca de forma tão verdadeira. Eis que então reconheço a potência própria do teatro e me alegro por estar envolvida nesse bonito trabalho.

De volta à sala de ensaio: deixemos os meninos respirar, indaga o Diogo. Vamos ver no que vai dar. Assim começou nosso ensaio de hoje, Marília, Dominique, Frederico, Vítor e Nina refazendo prólogo, cena 1, cena 2 e cena 3 soltos pelo espaço, abandonando marcas e profanando indicações. O que disso aproveitaremos ainda é obscuro, mas já é possível compreender como é forte e potente quando o jogo acontece com o corpo e não só com a palavra. Sim, o corpo, por favor. Mesmo que errado, torto, estremecido, embaraçado, mesmo que pesado, ruidoso e envergonhado, o corpo quer participar da brincadeira, quer chegar junto, quer mostrar a que veio. E vocês atores voltaram a lembrar os gestos e resgataram os jogos que havíamos abandonado e só agora percebo o quanto minhas intuições estavam certas: eu no fundo sabia que as coisas abandonadas nunca foram esquecidas.
Obrigada pelo prólogo de hoje Nina, Fred, Vítor, Marília e Dominique.

Após cena 3, improviso da cena 4. a primeira fala após tantos minutos de silêncio anuncia o grau de destruição que virá a seguir, destruição tal como a traça faminta devorando um velho livro: corrói as palavras gastas, desenhando um novo caminho.

E logo em seguida, Odilon e Andréia. Parece bobo da minha parte mas tenho torcido por você Odilon, estou quase vestindo a camisa do seu time: aqui não tem corno nem frouxo! estou quase lá...quero ver se você me convence amanhã...

Cecília e Rita entram logo depois disso, Cecília hoje quase chora falando com a Rita, é Cecília, nem tudo precisa ser dito em palavras...

Todos em cena, trocam as roupas. Odilon com diadema na cabeça, Inácio com a sandália de salto da Andréia, Andréia descalça e com aquele short não precisa de mais nada pra parecer um menininho, eles trocam as identidades, agora é Letícia quem vem chegando, Odilon é a "Lilla que traga". Letícia fumava um cigarro atrás do outro, alguém diz, ela tinha uma tatuagem no braço, uma pinta, um outro corrige, uma pinta no pescoço, não, a pinta era na coxa, era preta? era marrom. cheia de pêlos. Ela nunca tirou aquela pinta, era a marca dela, alguém dizia.

A Letícia tinha voz rouca, no tom mais grave
Gostava de mascar trident de canela e halls maça verde
Ela dizia: tô ótima Brasil!
Meio Débora Falabella. Não, meio aquela namorada do Homem Aranha.
Ela tinha olhos verdes, cabelo louro acinzentado
A coisa mais bonita da Letícia eram suas mãos. Não, era a generosidade. Ah! conta outra.
Letícia era antipática. Só no primeiro momento. É, só no primeiro e no segundo e no terceiro, quem sabe no sétimo...
Ela chamava o pai de Jorge.
Extremista.
Arrotava.
Quando não escutava as pessoas dizia assim: o que? que foi? o que?
Violeta sua cor preferida.
Ela xingava, xingamentos direcionados: vai-tomar-no-seu-cú.
Lembra da risada? e do cheiro? e do choro? e de como ela dançava...