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domingo, 15 de janeiro de 2012

pontos de vista para os próximos ensaios,,

meninos,

a partir de nossa reunião aqui em casa, tramei sete pontos de vista pelos quais acredito ser necessário passarmos, mirando cada cena novamente, uma a uma, tentando desdobrar aquilo que porventura esteja confuso, ou em falta, ou que tenha sido esquecido ou mesmo sequer ainda especulado. é uma maneira de olharmos para o que já temos e multiplicarmos as nossas implicações em expressão. é mais uma vez um jogo possível. mas tem que ser jogado. assim, o que descrevo abaixo não é nada inédito, mas sim um apanhado das questões que me pareceram mais recorrentes em nossas falas.

JOGO ou de que maneira - como - os atores expressam a cena, traduzem a dramaturgia;
BATIDA ou o tempo de cada cena (ou pedaço de cena), a duração e os inúmeros ritmos que constituem algum todo;
APROPRIAÇÃO ou em quais trechos ainda não se é confortável o jogo e como resolver isso, como ganhar a briga com as exigências da encenação e da dramaturgia;
CORPO-GESTO ou como o corpo de cada ator expressa aquilo inexprimível de sua personagem, um esboço de cada dragão (in)contido;
QUADRO ou como trazer a tona o que está soterrado sob o excesso de palavras e movimento, aquilo que é dito sem que as personagens percebam estar dizendo;
PARAGEM ou alguma maneira de permitir que a escuta aconteça, para que personagens bem como espectadores consigam deixar a ficha cair e tenham espaço-tempo para isso;
PERPLEXIDADE ou a tentativa em primeiro plano, como expressar alguma incompreensão que ali se encontra latente e em movimento.

como exposto, não é nada demais. os pontos de vista se confundem uns com os outros, mas é possível trabalhar solitariamente a partir de apenas um. pensar as cenas por tais olhares me parece determinante e extremamente proveitoso.

vejamos como vai ser isso.

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próximos ensaios de DRAGÃO

Abaixo, os próximos ensaios agendados:


Segunda 16.01
09h a 12h na UFRJ
trabalho sobre CENA UM


Quarta 18.01
19h a 23h na UNIRIO
(Vitor chega até 20h)
trabalho sobre CENA UM/DOIS


Quinta 19.01
19h a 23h na UNIRIO
(Vitor chega até 20h)
trabalho sobre CENA DOIS/TRÊS


Domingo 22.01
10h a 14h na UNIRIO
trabalho sobre CENA TRÊS


Segunda 23.01
09h a 12h na UFRJ
trabalho sobre CENA QUATRO


Quarta 25.01
19h a 23h na UNIRIO
(Vitor chega até 20h)
trabalho sobre CENA CINCO


Quinta 26.01
19h a 23h na UNIRIO
(Vitor chega até 20h)
trabalho sobre CENA SEIS


Segunda 30.01
09h a 15h na UFRJ
passadões e ajustes gerais


Terça 31.01
18h a 23h na UNIRIO
(Vitor chega ate 20h)
passadões e ajustes gerais


Dias 03 e 04/02, sexta e sábado
17h para arrumação, concentração e reconhecimento do espaço
21h início das apresentações na Gamboa

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terça-feira, 3 de janeiro de 2012

O Dragão


É pessoal e intransferível.
Cada qual tem o seu.
Desde os inícios.
No entanto, por um tiro certeiro e preciso, eis que agora reina no centro da sala esvaziada, um dragão de ronco lento e pesaroso. Um dragão entristecido.
É que no exato instante em que Letícia se lançou pela janela, ela deixou o bicho preso ali dentro do quarto. Ela se lançou porque o dragão a sufocava o íntimo. E então, certeira, da forma como era preciso, ela desistiu.
Só que dragões são grandes e invisíveis. São metáforas não porque não existam, mas porque vê-los seria para o homem um risco final a cortar sua pele e revelar o próprio íntimo. Seria algo como a morte súbita e sem explicação.

Mas ele ainda existe.

Só que os pais de Letícia lacraram a janela do quarto. Poucos dias após sua morte, eles decidiram sem dizer palavra alguma que era preciso apagar o fato – duro como um muro de pedras – de que sua filha preferira o salto ao jantar.
De que Letícia preferiu partir do que tentar resolver tudo como sempre achavam terem resolvido: ao redor da mesa da sala.
Então o medo cegou seus olhos. O pavor da culpa, a tentativa de atar o que para sempre será desatado. Eles cimentaram a janela. Mas o horror persistiu no branco da parede do quarto. O horror voa solto em meio ao vento empoeirado.

Ele morre aos poucos.

No entanto, persiste no quarto já sem cama ou armário. Ele ali apavorado, sem compreender porque o mundo o repudia e se afasta do seu bafo (o baforar de um dragão é seu primeiro contato; sua forma quente de dizer prazer em conhecê-lo).
Ele ali dentro irritadiço e machucado, fazendo sobre as coisas de Lilla alvoroço e estrago. Despencando caixas, procurando comida, revirando roupas e seguindo o cheiro dela que partiu. O que ele procura talvez seja só o seu abrigo que ruiu. Mas como achá-lo se a janela foi lacrada?

Ele desde então não fechou os olhos.

Pois dois meses antes, dormia dentro de Lilla incontido. Queria ser o que a garota em seu íntimo alimentava em segredo. E o íntimo dela era ele, o dragão que agora repousa sem casa ainda é a Lilla, porém com a face desarranjada.
Dois meses depois, eis que ali se encontram os amigos de Letícia para dividir entre si os pertences dela que ainda ocupam o quarto. O apartamento vazio e semi-reformado, aguarda – ansioso – a saída desse dragão para ser vendido ou alugado.

Ele não foi brincado.

Porque Lilla não conseguiu cavalgá-lo. Por isso ele está preso no quarto, como se estivesse de castigo. Ela pediu licença sem pedir, ela fugiu sem deixar bilhete. Isso é tudo o que sabemos. Mas ali, dentro do seu quarto, o dragão se comove com o manuseio dos amigos que um a um, adentraram sua prisão e dela retiram todas aquelas coisas que ele mesmo já havia vasculhado. O dragão, preso dentro do quarto, aos poucos se sente menos enclausurado.
Cecília informou aos amigos: sobrou aquela pelúcia, alguém vai querer? Não, ninguém quis, ninguém disse nada. Dentro do quarto por agora só mesmo o dragão e uma pelúcia estranha, judiada e conhecida. Eles se olham. Estáticos. Que estranha semelhança essa que nos aprontaram, talvez um deles pense.

Ele brinca com a pelúcia e a destrói.

Enquanto na sala, os amigos não cavalgam aquilo que Lilla não soube cavalgar. Eles ali na sala reunidos hoje tentam cavalgar a si próprios (sem saber ao certo que coisa estranha é essa que carregam dentro de si). O vazio, o buraco, o silêncio, a azia, o tempo, a loucura, o mito, o que não tem nome, o inominável, o nó, o vácuo, o absurdo, este absurdo imenso que não parece fazer sentido e que, no entanto, dói.

Doo logo existo.
Então,

De que modo ultrapassar uma coisa que não admite resolução?
Eis o título de nosso espetáculo: