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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

05:49

hora improvável para se atravessar ou vice-e-versa. eu estou diante deste computador, sobre a mesa uma caneca quente com mingau de aveia. com canela, com cereja. com uma colher que roubei do spoleto. eu queria dizer a vocês que recebi um convite do meu dragão. sim, ele roncou a noite inteira. dentro de mim a coisa ali respirando e fazendo do ruído composição sem fim. um requiem para mim. não de mim para mim. mas dele para meu corpo inteiro. ele ali dentro roncando e me acariciando meio sem jeito. os dragões tem essa vergonha de assumir sua delicadeza. só que hoje está tão quente dentro desse quarto, a noite está tão assumidamente perdida, que eu sinto que ele apostou ser o que é e por isso me perguntou, logo agora tenha eu aberto os olhos.

ele me perguntou: posso? meus olhos abriram. e me vi na possibilidade ali entretido e preso. eu não quis responder, eu quis ficar. eu fiquei, sobre a cama ainda deitado eu aos poucos fui me sentando e esticando o corpo. mas a coluna doeu logo quando se aproxima coluna ao centro do corpo. a coisa não vai. a coisa não foi. dentro, ele me pedia para abrir suas asas e partir. fiquei calmo, e me disse, só pode ser a ti que ele está perguntando. não tema respondê-lo, ele vai entender. é que dentro, confesso, eu sentia não ser hora para recreio. eu senti e ainda sinto, dentro, não haver necessidade alguma para cruzar a esta hora da madrugada. eu fico, gente. eu ainda quero ficar. não vem com isso de abrir as asas dentro de mim e me estuprar. eu fico.

então meu dragão dorme em mim ainda feito ovo. sim, como este mingau quente, tão quente, com cerejas e canela, para entreter sua vaga sensação de abandono. para dizer de forma morna e matinal eu, eu estou contigo, bom dia. ele se acomoda novamente. ele esboça até um semi-abrir das asas, mas é para se coçar e caber melhor dentro de mim. porque pesa. é fato. ele é tipo pedra, mas pedra que aprendi a amar. ele me perguntou posso te partir comigo? posso de ti me levar? e hoje cedo nesta aurora nem sequer inda anunciada, eu lhe disse: não. não é uma hora bonita para ser de ti levado. para romper com si próprio nem com os outros.

e tudo está tão lindo. esse mingau, esse céu tingido a um vermelho contido (querendo nascer). esse ventilador simulando um vento vindo-se lá de onde, eu não sei. meus olhos abriram e eu quis amar este convite que me foi feito. eu quis nele me esbaldar e durar. se se cavalga um dragão? eu me pergunto. não por saber a resposta. não por importar sabê-lo. talvez seja possível. basta não ter o medo inaugural que é o de ignorá-lo. o dragão. ele cria cisma e te devora numa fração do instante. se se pode cavalgá-lo? bom, agora que ele dorme, talvez seja melhor eu me deitar novamente. atrasar o despertador e começar meu dia quando meu corpo puder sustentá-lo, afinal, eu não estou só. dentro de mim mora vaga a sensação de um dragão inteiro.

06:00.

Diogo Liberano