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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

A arte de se salvar



Li o livro "A Arte de se Salvar (ensinamentos judaicos sobre o limite do fim e da tristeza)" de Nilton Bonder ano passado e fiz algumas anotações.Depois da nossa última reunião quis colocar algumas anotações aqui.Achei que poderia nos ser útil.

Medo/Tristeza/Angústia/Esperança
O medo da tristeza é o elemento principal que fertiliza a sensação de desespero. No entanto, a tristeza em si pode ser um importante instrumento de fé. Todos conhecemos a experiência que se sucede ao nos entregarmos a um choro profundo que alivia o coração e o faz mais leve abrindo novas perspectivas de esperança. A verdade é que não conseguiremos explicar este fenômeno apenas como uma descarga de sentimentos que nos desopila.Não se trata apenas de um “volume” de tristeza a ser escoado. A razão de a tristeza ser seguida de uma sensação de esperança tem a ver com um ensinamento que descobrimos ao entregar-nos a ela. Revela-se a nós o fato de que cada instante traz em si os meios para que lidemos com ele. Por mais terrível que possa ser ou parecer nossa realidade, há sempre à nossa disposição uma forma de vivê-la.
                Na verdade, acreditar que cada momento traz em si tudo o que ele mesmo possa vir a exigir de nós é a maior de todas as esperanças. Esta esperança se traduz numa forma de confiança seja no Criador, no Universo ou na Natureza que não exige abrirmos mão de nosso intelecto. Sabemos que não podemos esperar nem cobrar que a vida não nos faça conhecer nenhuma perda, ou até mesmo a perda dela própria. No entanto, esperar que cada situação tenha inerente a ela os meios pelos quais possamos suportá-la e que permitam lidar com ela é um ato de fé que não contradiz a realidade.
                No Talmude há um dito que expressa uma lógica referente às leis que poderia ser estendida às leis naturais, existenciais e espirituais. Diz esta máxima: “Não se decretam leis ou éditos que não possam ser cumpridos.” Confiar não é o ato de esperar que nada de errado nos aconteça, mas, acima de tudo, ter certeza de que seja qual for o édito, este virá sempre acompanhado dos meios para ser suportado. Esta é, na realidade, exatamente a definição de não desesperar.
                Isto vale para a angústia e para a ansiedade: o fundamental não é que se procure sublimá-las, mas vivê-las. Quando vividas, elas se esgotam.
(...)
                Esta capacidade de concentrar ansiedade, tristeza e luto não se consegue através de fuga, mas do enfrentamento destes sentimentos. Todos estes sentimentos podem ser relevados se vividos profundamente. A evidência maior se encontra no sorriso que desponta depois da entrega ao pranto, ou na sensação de triunfo e transcendência que experimentamos depois do sofrimento.
                A tristeza é uma oportunidade, não deve ser perdida. Se ela passar por você, persiga-a com a certeza de que ela lhe indicará o caminho para o “oásis”. A tristeza, portanto, é um mecanismo capaz de restabelecer nossa confiança de que cada momento contem em si a forma de ser enfrentado. Cada vez que vivenciamos a tristeza e a suportamos, se fortalece nossa esperança de que também nos céus prevaleça a lógica que evita que se baixem decretos que estejam além das possibilidades de que sejam cumpridos.

O verdadeiro medo diante do julgamento final
                Reb Sussia era um homem de grande bondade e em seus últimos momentos de vida se encontrava junto de seus mais queridos discípulos. Eles estavam profundamente angustiados, não só pela eminente perda do mestre, mas porque este estava muito agitado, como se algo o preocupasse. Um deles voltou-se ao rabino e inquiriu sobre a razão de tanta aflição. Reb Sussia então disse: “Estou com medo do Tribunal Celeste...” Os discípulos ficaram perplexos: como podia uma pessoa do porte humano do Reb Sussia temer a auditoria celeste? Como uma pessoa tão bondosa poderia estar receosa de prestar contas de sua vida?
                O rabino prosseguiu: “Não tenho medo de que me cobrem porque não fui neste mundo como o profeta Moisés, que tanto realizou pela humanidade. Não tenho medo porque posso sempre responder que não fui Moisés porque não sou Moisés. Também não temo de que me cobrem ter sido como o filósofo Maimônides, que tanto fez por nossa tradição, porque posso sempre responder que não fui Maimônides porque não sou Maimônides. No entanto, temo e me apavoro com a possibilidade da pergunta: “Reb Sussia, por que não foste Reb Sussia?”